18 de abril de 2011

Outorga onerosa e tributação

Do solo criado

  • Do solo criado. Outorga onerosa do direito de construir: instrumento de tributação para a ordenação do ambiente urbano, Luiz Henrique Antunes Alochio, Lumen Júris, 2005, 301 pp.

No tocante à versão financeira do solo criado, a perplexidade que se põe reside na definição da natureza jurídica do quantum pago pelo beneficiário, em razão da construção acima do plafond legal de densité. Sempre me pareceu que esse aporte financeiro fosse de natureza tributária, constituindo o pagamento de uma taxa pela licença de construir além do plafond. Essa exatamente é a questão lucidamente enfrentada pelo Professor Luiz Henrique Antunes Alochio no livro ora prefaciado [...]. O autor se orienta no sentido tributário da aludida contraprestação, demonstrando com absoluta segurança dogmática a posição em que se coloca.É uma questão que não está abordada na bibliografia corrente e o autor a enfoca com rara proficiência.É um título que não pode faltar no acervo daqueles que se interessam pelo tema.

Este trabalho investiga a trajetória recente de implementação do instrumento da Outorga Onerosa do Direito de Construir, ou Solo Criado, no debate urbanístico no Brasil, recuperando o debate em nível nacional desde a década de 1970 até a regulamentação do instrumento pelo Estatuto da Cidade. O texto também recupera algumas das experiências municipais de utilização da Outorga Onerosa no Brasil, revelando a tensão existente entre o conteúdo arrecadatório e regulatório presentes no instrumento.

 

“Solo criado” é a expressão que identifica a possibilidade de construção de pavimentos sobre ou sob o solo natural de um imóvel (área do lote), tornando possível a construção de “solos” adicionais, tanto quanto permitido pela legislação municipal. Na definição do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Eros Grau, solo criado artificialmente pelo homem, sobre ou sob o solo natural.

A figura do “solo criado” incorpora a idéia de que cada proprietário teria direito a um coeficiente de aproveitamento único, em princípio igual a 1, o que implicaria dizer que cada proprietário teria direito a erguer em seu lote uma construção com área igual à área do lote (cada m2 do terreno equivale a 1m2 de edificação).

Cada terreno urbano, porém, deve ser aproveitado de acordo com parâmetros individuais, em função do planejamento urbanístico e a densidade de ocupação de cada zona do município. Dessa forma, pode o município estabelecer que, em determinadas zonas, seja possível a existência de edificações com coeficiente maior que o coeficiente de aproveitamento único.

Se o proprietário desejar construir área maior que aquela que lhe permitiria o coeficiente único, esse direito pode ser adquirido do particular, mediante transferência do direito de construir (imóveis tombados ou com cobertura vegetal, que não são edificáveis, podem “vender” o direito de construir inerente ao seu terreno), ou do município, por concessão, mediante o pagamento de uma contraprestação denominada “outorga onerosa do direito de construir”.

Por muitos anos discutiu-se a constitucionalidade da verba cobrada pelos municípios pela outorga onerosa do direito de construir: alegavam os proprietários que se tratava de nova espécie de tributo, não prevista na Constituição Federal, o que tornaria indevida a cobrança da parcela. A questão voltou à pauta quando o Estatuto das Cidades incorporou o tema, prevendo a possibilidade de a outorga onerosa do direito de construir ser utilizada pelos municípios como instrumento de regulação urbana.

Recentemente o Supremo Tribunal Federal teve a oportunidade de examinar a questão, tendo decidido que a remuneração pela utilização do solo criado não constitui exigência tributária. Alegava-se, no caso, que a remuneração configuraria hipótese de imposto criado sem base constitucional – tese que acabou rejeitada pelo STF.

Para o Supremo, trata-se de compensação financeira pelo ônus causado em decorrência da sobrecarga da aglomeração urbana. É taxa para exercício de uma vantagem, faculdade atribuível ao proprietário de imóvel, a quem se permite o direito de construir acima do coeficiente adotado em determinada área, desde que atendida uma contraprestação. Quem não cumpre uma obrigação, está sujeito a uma sanção. Quem não paga o ônus, deixa de receber uma vantagem. O tributo é uma obrigação, não um ônus – ficando assim descaracterizada a cobrança da outorga onerosa do direito de construir como tributo.

 

outorga

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